segunda-feira, 29 de setembro de 2014

CAMINHOS



O sujeito se aproximou de repente e me disse:
 - Será que o senhor pode me ajudar?
 - Talvez.
 - Talvez?
 - Sim.
 - Como assim?
 - Pode ser que eu possa ou pode ser que eu não possa.
 - Gostaria apenas de pedir uma informação.
 - Ah, então é bem provável que eu possa ajuda-lo; que tipo de informação exatamente o senhor necessita?
 - Eu... bem, não sei muito bem.
 - Não sabe muito bem. (arregalando os olhos)
 - É...
 - Então não poderei ajuda-lo, desculpe-me.
 - Espere talvez você possa. É; talvez você possa me ajudar.
 - Então fale.
 - Acontece que eu não sou daqui.
 - Sei.
 - E eu... estou tentando chegar a um lugar.
 - Que lugar?
 - Este é o problema, sabe.
 - Qual é o problema?
 - Acontece que eu... eu não sei muito bem para onde ir.
 - Se não sabe para onde quer ir então eu não posso ajuda-lo.
 - Mas você poderia me indicar um caminho.
 - Para onde?
 - Para qualquer lugar.
 - Não posso fazer isso.
 - Por quê?
 - Porque você é quem tem que decidir para onde quer ir.
(pequena pausa hesitante)
 - Parece que você tem razão mas eu ainda não consegui me decidir para onde quero ir.
 - Então não posso ajuda-lo.
 - Eu vou para qualquer lugar, foda-se.
 - Ah, há há há há há; agora você me fez lembrar de Alice.
 - Alice?
 - Sim.  Aquela do país das maravilhas.
 - Nunca ouvi falar.
 - Nunca ouviu falar em Alice no País das Maravilhas?
 - Não até este momento.
 - Puxa! Você é estranho!
 - Eu te disse que eu não era daqui.
 - Por que não procura por alguém que possa realmente ajuda-lo, eu não posso fazê-lo, bem vês.
 - Fale-me sobre Alice.
 - O que?
 - Alice, me fale sobre ela.
 - O que você quer saber?
 - Você disse que eu estava parecendo Alice no País das Maravilhas.  Por quê?
 - Quer mesmo saber?
 - É claro, agora sei que você pode me ajudar.
 - Pois bem, ouça.  Alice estava perdida no país das maravilhas e encontrou Cheschire de repente no...
 - Cheschire?
 - Sim, Cheschire.  Um gato.
 - Esquisito isso.
 - Apenas ouça, está bem?
 - Vá em frente.
 - Então, como eu dizia.  Alice estava perdida no país das maravilhas e encontrou Cheschire no meio da floresta e então perguntou a ele para onde deveria ir e ele apenas lhe respondeu; bem, isto depende muito do lugar aonde você quer ir.  Ao que Alice replicou; para mim qualquer lugar serve.  E então Cheschire disse-lhe; ah então não importa o caminho que você irá escolher.  Entendeu?
 - Sim... faz muito sentido.
 - Pois é.
 - Isto elucida muito bem a minha situação, mas não me aponta um caminho.
 - Porque o caminho quem tem que escolher é você.
 - De fato, mas isto não é algo muito fácil de se fazer.
 - Às vezes sim, às vezes não.  Na maioria das vezes é muito difícil de se fazer.
 - Oh meu Deus!
 - Talvez haja algumas possibilidades extremas.
 - Quais?
 - O fim do mundo e o centro do mundo!
 - Isto parece interessante.
 - Certamente.
 - Pois então eu vou para o centro do mundo.  É longe?
 - Pode ser aqui mesmo.  Depende muito do ponto de vista.
 - Ah, então já estou nele.
 - Mas, na verdade, quando me referia ao centro do mundo falava mais                     especificamente do centro econômico e político do mundo.
 - Ah, então não é aqui!
 - Não.  É muito longe daqui.
 - E o fim do mundo?
 - É um lugar onde só há neve, frio e ventos terríveis.
 - Parece cruel.
 - Por isto eu chamo de fim de mundo.
 - E como é o centro do mundo?
 - É um lugar onde você pode encontrar qualquer coisa que deseje.  Há muitas metrópoles cosmopolitas, luzes, multidões, edifícios e coisas tantas que eu poderia passar um dia inteiro falando-lhe sobre isto e ainda assim não seria o suficiente.
 - Acho que agora tenho um rumo.
 - Vai para o centro do mundo?
 - Acho que sim.  Como faço para chegar até lá?
 - Isto depende.
 - Do que?
 - Vai de avião?
 - Vou a pé.
 - Ah então você vai levar muito tempo até conseguir chegar àquelas terras.
 - Tenho muito tempo.  Por onde devo ir?
 - Caminhe para o norte por infindáveis dias.  Caminhe sem parar.  Caminhe até que o chão onde estiver pisando tenha se tornado uma terra árida e seca e o sol tenha se tornado tão abrasador que seja impossível caminhar durante o dia.  Isto levará muito tempo, você terá que ser muito forte.  Depois siga para  o oeste por infindáveis dias até certificar-se de que chegou ao planalto e aí continue caminhando sem parar até alcançar regiões alagadas, quando isto acontecer siga num ângulo de 120 graus para noroeste e caminhe por uns três dias.  Evite morros e adentre a região de floresta, é por lá que deverá seguir agora por infindáveis dias.  Prepara-te para atravessar muitos rios e suportar muitas chuvas.  Carregue sempre dinheiro consigo, será preciso.  Siga para o norte sem parar atravessando toda a região das florestas, siga para o norte até encontrar pessoas que falam espanhol, esta parte será difícil e perigosa, é bom que tenha uma boa mochila também porque vai precisar levar algumas coisas, mas leve o mínimo possível para evitar um peso desnecessário.  Daí por diante terá que pedir algumas informações mas, basicamente seguirá sempre para noroeste durante muito, mas muito tempo.  Atravessará alguns países mas todos razoavelmente parecidos.  Não se canse.  Estará no rumo certo sempre seguindo para noroeste.  Mas chegará um dia, quando descobrir que está num país chamado Panamá, em que terá que seguir para sudoeste num ângulo de uns...deixe-me pensar... 190 graus talvez e isso por uns cinco ou seis dias mais ou menos.  Aí depois retome o rumo norte-noroeste.  Atravessará estradas difíceis.  Quando chegar a uma imensa cidade chamada Cidade do México, anime-se, você estará no rumo certo e este será o momento de apertar o passo em direção ao norte.  Mas não pense que será fácil, será tudo muito, muito difícil mesmo, difícil e cansativo.  Você terá que ser perseverante e estar preparado para ouvir muita gente aconselhá-lo a desistir.  Não dê ouvidos a eles, continue.  A parte difícil será atravessar a fronteira, mas estou certo de que conseguirá.  Tenha muito cuidado quando alguém gritar; LA MIGRA, LA MIGRASe ouvir isto corra, fuja, seja rápido, se preciso for esconda-se.  Mas enfim, depois que passar por tudo isto é provável que ainda tenha que atravessar um deserto.  Neste momento estará caminhando aonde as pessoas falam inglês e terá que ser muito esperto.  Deverá tomar o rumo norte-nordeste sem parar até alcançar uma cidade chamada Nova York, ou melhor, lá eles dizem New York, sacou?  New York e então, muito provavelmente neste momento terá alcançado o centro do mundo.
 - Parece algo incrível!
 - E é.
 - E se eu resolver rumar para o fim do mundo?
 - Então a direção que deve seguir é sul.
 - Sul, sudoeste, às vezes sul, sudeste.
 - É mais distante que o centro do mundo?
 - É menos distante mas, muito mais difícil de se chegar.
 - Será?
 - Com toda certeza.
 - Como pode afirmar isso?  Já esteve lá?
 - Não.
 - E no centro do mundo, já esteve?
 - Não.
 - E como sabe destas coisas?
 - Bem, eu sei de algumas coisas.
 - Você fica aí parado o dia todo e pensa saber das coisas.
 - Fico parado aqui porque trabalho aqui.
 - E seu trabalho é falar com pessoas?
 - Sim, exatamente.  O senhor é muito perspicaz.
 - Obrigado.
 - De nada.
 - Mas então você fica aí parado e fala com pessoas, é isso?
 - Sim, eu fico tentando vender sapatos. 
 - Parece interessante.
 - E é.  Mas sabe, há momentos em que isto me chateia mesmo.
 - Sério?
 - Sim, um dia vou sumir daqui.
 - Sempre é preciso de novidade na vida, não é meu amigo?
 - Com certeza.
 - Você está nessa há muito tempo?
 - Já faz alguns anos.
 - E quando pretende sumir?
 - Não sei, eu fico tentando mas nunca consigo.
 - Talvez você tenha se acomodado.
 - Ou talvez eu esteja aprisionado...
 - É.
 - Pois é...
 - Há muita coisa por aí, muita vida.
 - É, eu sei.
 - Você parece ser um bom sujeito.
 - Eu tento ser um bom sujeito.
 - Basta ser quem você realmente é.
 - É... acho que você tem razão.
 - Bom, então eu já vou indo.
 - Boa viagem amigo.
 - Obrigado – e foi saindo.
 - Mas, ei; você vai para onde? Vai mesmo para o centro do mundo?
         O homem se virou sorrindo.
 - E porque é que você quer saber?
 - Eu apenas perguntei.
 - Os caminhos vão surgindo e eu vou seguindo por eles.  Você já me ajudou bastante, muito obrigado.  Espero que um dia encontre também o seu caminho e não precise mais ficar aí vendendo seus sapatos.  Até um outro dia.






                                                                                Morpheus

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