sábado, 30 de janeiro de 2016

ESTRANHAMENTOS


  Pedi licença e saí para mijar.  Entrei naturalmente no banheiro, me dirigi ao mictório, baixei o zíper, tirei meu pinto para fora e comecei a mijar com toda a tranquilidade do mundo.  Encostei o braço no apoio da mureta que estava ali e quando olhei para baixo e notei o quanto era branca e limpa e iluminada aquela minha camisa social (que eu quase nunca usava) eu fiquei realmente impressionado. De repente era um insight.  Tive aquele pressentimento.  De repente tive a certeza de que aquela camisa social era a mesma que seria usada em meu enterro um dia.  Era como se eu fosse um defunto olhando para a barriga.  Logo me lembrei de um dia quando estava na igreja e observava todos os outros irmãos vestidos com seus ternos como se estivessem todos prontos para serem enterrados. Por que, no fundo, para muita gente a igreja não passa disso, uma preparação para a morte. E por um instante era como se eu estivesse sentindo o cheiro daquelas flores, aquelas flores de velório. E aquela sensação de morte começou a tomar conta de mim até que eu olhei para o meu pinto mijando lá embaixo e finalmente tive a certeza de que estava vivo.  Eu mijava! Mortos não mijam.  Graças a Deus eu estava vivo e bem.  Então minha urina acabou e eu chacoalhei minha ferramenta e o guardei de volta nas cuecas.  Fechei o zíper.  Fui ao lavatório e lavei as mãos como um bom cavalheiro.  Saí do banheiro para o mundo externo ainda como se estivesse sentindo o cheiro daquelas flores de enterro, era como se ao redor pairasse aquele aroma de jasmins e margaridas.  Coisa estranha.
  O que é que uma camisa social branca quase nunca usada pode fazer!

                   
                                                                                                              Morpheus

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

EU


Eu levo chuva onde não há
Se preciso for
Eu levo alegria onde não há
Se preciso for
Eu levo a mentira onde há a prepotência
Se preciso for
Eu levo
Eu faço
Eu crio, eu invento

Mas alguém já afirmou que os poetas estão todos mortos
E que estes versos mal escritos estão todos muito tortos



                                                   

                                                                                             Morpheus