sábado, 30 de julho de 2011

VISITA

Esperei até que o inverno finalmente chegasse
e os dias se tornassem mais curtos

Esperei até o dia em que tudo estivesse
acontecendo da forma mais natural possível
e que jamais alguém pudesse imaginar ao me ver
que eu já não os tinha mais ao meu lado

Escolhi um final de tarde de sábado quando o vento era frio e cortante
e o sol parecia morno por entre as folhagens das árvores

Não pensei em nada para dizer antes da hora
e quando cheguei tudo estava exatamente como antes

Eles estavam à minha espera
e enquanto eu descia a ladeira do cemitério
pensava na brevidade da vida
e na insignificancia de nossa passagem,
pensava em minha filha,
nas contas que iam vencer,
e pensava em como eram bonitas algumas lápides

Aos poucos me emocionava sem querer,
mas quando cheguei diante dos túmulos
tudo era frieza

eu não sabia o que dizer

eu...
eu deveria dizer alguma coisa?

para quem?

LÁPIDE DE CONCRETO

datas de nascimento e morte;
vento frio e cortante

eu ali parado

Permaneci fitando a frieza cinzenta dos túmulos

Estava cansado

Tentava me lembrar de minha mãe, de meu pai;
queria reter a lembrança deles em minha mente

Queria me lembrar deles
eu queria, queria muito

Mas havia um túmulo à minha frente
um túmulo

Chorei

Senti saudades, muitas saudades

Aos poucos me senti mais à vontade e comecei a falar
com mamãe e papai...

já faz algum tempo que não venho,
eu ando correndo por aí
eu ando trabalhando muito, mas vocês; bem, vocês ficariam orgulhosos
de mim
(e chorei)
hoje eu sou chefe de família,
em breve terei mais uma filha,
me atrevo a escrever poesia
eu...
posso ser meio maluco mas;
sinto falta de vocês

E lhes falei
que somente eu fiquei
naquela casa
Somente eu tenho tudo ainda comigo
a saudade e o silêncio
quando lá estou sem o meu velho e a minha mãe
Somente eu, poeta orgulhoso
ouvindo Pink Floyd na velha casa dos velhos que já se foram
Somente eu...
não quero esquecer o metalúrgico e a telefonista
somente eu sou suficientemente egoísta para pensar
que somente eu tenho saudade de vós
Mas somente eu
fiquei sozinho naquela casa...
lembrando do tempo em que mamãe chegava trazendo biscoitos de polvilho
e papai meio chapado demorava a estacionar o carro
e eu era menino

Hoje sou homem
e já deixei as coisas de menino
Por isso trabalho demais e assim como papai
ás vezes bebo demais
e assim como mamãe, me estresso ás vezes
e assim de meses em meses
o tempo vai passando
e a saudade vai ficando

Saudade é inefável
portanto, depois de conversar um pouco
pedi licença
me despedi e fui embora

Deixei mamãe e papai prometendo voltar outro dia
mas quando cheguei em casa aquela saudade ainda existia

                                                                                     Morpheus

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